sexta-feira, 13 de maio de 2011

Irreal realidade

Todos os dias ela acordava com uma profunda tristeza em seu coração. Acordar era seu grande problema. Após abrir os olhos, ficava um pouco mais, fitando as telhas do quarto, agarrando-se a cada segundo de seu sonho feliz. Quando então percebia que já não podia mais se demorar ali, levantava-se e encarava outro dia. O sol ainda estava nascendo, o céu mesclado com as cores da noite que ia e com as cores da manhã que logo chegaria ali. Havia pessoas na casa, mas era como se estivesse só. Ela sempre se sentia só. Era mais um triste dia de trabalho. Deu alguns passos em direção ao banheiro. Sempre que entrava no cubículo, abria seu armário, pegava suas coisas e escovava os dentes. Sempre de olhos fechados. Não que quisesse dormir mais, era só para não ter de ficar de frente para a própria imagem refletida no espelho. Não gostava de espelhos. Eles eram juízes impiedosos, que sempre a acusavam, sentenciando-a toda vez que o encarava. Seus olhos tinham a mesma cor dos olhos de alguém que ela não conheceu, seus cabelos eram escuros; ela os preferia assim. Não era bonita. Simplesmente não se encaixava em lugar nenhum. Depois de um banho e de alguns minutos se preparando, ela saiu de casa pronta para mais um dia. Ainda se lembrando da linda moça, talvez da mesma idade da sua, correndo pelas ruas chuvosas de um lugar que sempre quisera visitar. Ela ia ao encontro de um homem sorridente. Ela corria até chegar onde ele estava. Seus cabelos iam a onde o vento os empurrava. Ele estendia sua mão na direção que ela vinha, até que ela pudesse tocá-la. Então, agarrada ao braço do rapaz, eles saiam juntos caminhando, felizes, conversando algo que ela não podia ouvir. Toda vez, era um sonho diferente, mas sempre os mesmos personagens desconhecidos. Ao contrário dos seus dias, sempre iguais. Já estava no mesmo assento do ônibus que todos os dias a levava para o trabalho. Revirava a bolsa a procura de seus fones de ouvido. Até as músicas já a aborreciam. Sempre as mesmas. Não sabia nem dizer o porquê não renovava suas listas de música. Ela ia então observando as ruas conhecidas, imaginando como seria se sua vida fosse diferente. Se fosse outra pessoa, em um lugar distante, e feliz. Como a moça do sonho. Sua vida beirava a melancolia. Ás vezes, sentada ali, ela pensava no absurdo que era a sua existência. Era doloroso demais ficar só, mesmo depois de tanto tempo. Nunca tinha tempo para outra coisa, do que seus pensamentos. Depois de um longo dia cansativo e solitário, voltava para casa. Ela podia ver as pessoas ao seu redor, mas era como se não existissem. Era como se fossem pinturas se movimentando nas paredes ao seu redor. Borrões, nada mais que isso. O que sabia era que estava sozinha e sempre estaria. Sua única companhia era o vazio imenso que a cobria. Não sentia gosto ao comer, prazer ao beber, os livros que tinha estavam todos em branco. Os ponteiros do relógio nunca saíam do lugar. Até que sempre chegava aquela parte do dia em que tudo desmoronava. Ela se deitava então, e chorava convulsivamente, até que esbarrava na beirada da cama. Então algo como um vazio começava a sugá-la e ela não via como fazer para impedir de ser arrastada para o nada. De repente ela estava no vácuo, e então, não estava mais, não existia mais. Depois o impacto.

Giulia, você está bem? ─ Perguntou ele ao me acordar com uma expressão preocupada.
─ Estou sim, foi só aquele sonho outra vez. ¬─ Falei olhando o relógio. Eram 4:35 da manhã.
─ O sonho com a garota do ônibus? ─ Perguntou ele confuso
─ Esse, mesmo. Sempre o mesmo. Ela sonhou conosco outra vez...

Um comentário:

  1. Muito assustador! Deus me livre se eu fosse essa garota que está no sonho dos outros...Sem ter a vida real.Adorei continua escrevendo tá! Beijos!

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